sexta-feira, 31 de maio de 2013

Eros e Psiquê

     EROS E PSIQUÊ, ENCONTRO DO AMOR COM A ALMA

     o mito de Eros, o amor, tem várias versões apresentadas. Se Afrodite é a deusa do amor, Eros é o próprio amor, a essência do sentimento criador de toda a vida, força poderosa que não se tem domínio, muito menos origem, visto que ele é o próprio princípio de tudo.


     Eros é um deus ordenador que surgiu do Caos, definindo e harmonizando o universo, trazendo paz a ele, mas mantendo aceso o fogo do conflito. É da sua inteligência voluntariosa que os deuses e os mortais são gerados.
Eros não faz parte do conselho dos deuses do Olimpo, tão pouco se sabe ao certo, a qual geração de deuses ele pertence, mas a sua influência é mais poderosa do que a do próprio Zeus, visto que o amor muda o destino até do poderoso pai dos deuses.

     Para Hesíodo Eros é uma divindade primordial, que surgiu logo depois do Caos, no mesmo instante que surgiu Gaia (Terra). Como o amor é fundamental para o princípio de todas as criações, Hesíodo, em sua obra Teogonia, põe o nascimento de Eros primeiro que o de todos os outros deuses, ele é filho do próprio Caos, e virá, ao lado da força procriadora de Gaia, harmonizar e povoar o universo.

     O Amor Apaixona-se Pela Alma

     Em um dos muitos templos gregos dedicados a Afrodite, um mortal comentou que uma das filhas do rei era mais bela do que a própria deusa do amor. Tratava-se da princesa Psiquê (Alma). Logo o boato da sua formosura espalhou-se por toda a Grécia. Homens de todas as partes vinham para contemplar a beleza da mortal, abandonando de vez o templo de Afrodite.



     Ao saber do abandono do seu templo às ruínas, em prol da beleza de uma simples mortal, Afrodite é acometida de uma violenta cólera e desejo de vingança. Decide que a princesa Psiquê, responsável pelo desvio dos homens, deverá ser punida. A deusa pede ao filho Eros, que vá até a mortal, que com a suas flechas do amor, fira-a de maneira que se apaixone pelo ser mais desprezível de toda a Grécia, fazendo-a uma mulher infeliz.

     Eros desce do Olimpo, com a perversa missão de envolver Psiquê na mais triste e destruidora das paixões. Mas Eros, ao deparar-se com mulher tão bela, é ferido pelas próprias setas, apaixonando-se perdidamente por ela. Vencido pelo sentimento inesperado, Eros volta ao Olimpo, mentindo para a mãe, dizendo à deusa que cumprira a missão. Afrodite sente-se vingada.
     Apaixonado pela bela princesa, Eros não sabe como viver o seu amor por ela sem que a mãe fique sabendo. Envolto pela paixão, ele confessa os sentimentos ao deus Apolo, que promete ajudá-lo.



     De longe, Eros faz com que a amada não goste de mais ninguém. Apesar de ser a mais bela das três irmãs, Psiquê não se apaixona por pretendente algum. Vê as irmãs desposarem homens ricos, mas não se convence a amar ninguém. Ela não sabe da existência do amor de Eros, mas pressente-o. A alma sente o amor invisível e próximo, e mesmo sem o conhecer ou ver, aguarda e chama por ele. A princesa torna-se prisioneira de uma solidão voluntária.

     Preocupados com o destino da filha, os pais procuram o oráculo de Apolo. Ali vem a revelação: Psiquê deverá ser vestida em trajes de núpcias, depois conduzida para o alto de uma colina, aonde um terrível monstro, mais poderoso que os próprios deuses do Olimpo, virá buscá-la e fazê-la a sua esposa.

     Diante de tão terrível revelação, os pais de Psiquê levam a filha ao local ordenado pelos deuses. Aos prantos e protestos das irmãs, Psiquê é deixada sozinha no local indicado pelo oráculo. Corajosamente espera que se cumpra o seu destino. Espera por horas que lhe venha buscar o monstro que se tornará o seu marido.

     Sozinha, Psiquê espera pelo monstro que a irá desposar. Cansada da espera, a princesa adormeceu. Zéfiro, o vento suave, transportou a bela princesa adormecida para um bosque cheio de flores.
     Quando Psiquê despertou, viu à sua volta, um riacho de águas límpidas, as mais belas flores, e um imenso e imponente castelo. De repente, uma voz quente e agradável convidou a princesa para entrar no castelo.     
     Conduzida pela voz, ela percorre várias salas e corredores. Pára em uma sala, envolvida por uma música suave. Senta-se à mesa, aonde um farto jantar a espera. Não vê ninguém. Aparentemente está sozinha, mas sente-se observada.

     Assim, solitária, após alimentar-se e a banhar-se, vê a noite chegar. Recolhe-se ao leito e espera que o terrível monstro venha fazê-la sua esposa. Protegido pela escuridão, Eros aproxima-se da bela princesa. Envolve-a em ternas carícias, tomando-a para si de forma ardente. Nos braços quentes do amante, Psiquê sente-se tranquila, dissipa-se o medo. Não lhe vê o rosto, mas sente-lhe o corpo viril e apaixonado. Psiquê sente-se feliz como nunca ousara ser.




     Assim passaram-se os dias. Psiquê recebe todas as noites a visita ardente do amado. Não tem medo dele, pelo contrário, mesmo sem ver-lhe o rosto, ama-o cada vez mais. No imenso castelo não há mais vestígios da solidão, do medo ou dos conflitos dos sentimentos. No meio daquela felicidade, Eros fez a mulher jurar que jamais lhe veria o rosto, teria que confiar apenas no seu amor. Apaixonada, não foi difícil para Psiquê fazer o juramento.



     A bela mulher viveu feliz até o dia que pediu a Eros para que pudesse receber as irmãs no castelo, pois as pobres mulheres viviam atormentadas com o triste destino que pensaram, tinha ela seguido. Eros, mesmo contrariado, permitiu que as cunhadas visitassem a mulher. Quando as duas irmãs encontraram Psiquê tão feliz, baniram imediatamente dos seus corações, a tristeza pelo destino da irmã. Sucederam-se outras visitas. A cada uma delas, as princesas viam a irmã mais feliz. Esta felicidade passou a incomodá-las profundamente. Tanto, que passaram a pôr dúvidas no coração de Psiquê. Como poderia saber quem dormia ao seu lado, se nunca lhe tinha visto o rosto? E se fosse o mais terrível dos monstros? Afinal o oráculo de Apolo previra que ele seria um monstro. E se esse monstro a matasse um dia? Apesar de garantir às irmãs que o marido não lhe parecia um monstro, elas perguntava-lhe se ele era belo e jovem, por que não lhe mostrava o rosto?


     A cada visita das irmãs, uma nova dúvida era posta na mente de Psiquê, até que ela deixou o veneno da desconfiança tomar-lhe o coração. Orientada pelas irmãs, Psiquê deveria preparar uma faca afiada e uma lâmpada de azeite, esperar que o marido adormecesse, iluminasse a sua face com a lâmpada, se fosse um monstro, matá-lo com a faca. Invadida pela dúvida, assim agiu a atormentada princesa. Após uma longa noite de amor, Eros adormeceu exausto. Psiquê aproveitou o sono do amado, para acender a lâmpada e ver o seu rosto. Quando a luz iluminou a face do amante, Psiquê pôde contemplar não um monstro, mas o mais belo de todos os deuses, o belo filho de Afrodite! Emocionada, lágrimas rolaram pelo rosto da mulher. Sentia-se culpada por ter quebrado a promessa que fizera ao marido. Sem querer, Psiquê entornou o azeite quente da lâmpada nas costas de Eros. O deus do amor acordou com a dor que lhe causara o azeite. Viu o seu rosto iluminado por Psiquê, percebendo o que se tinha sucedido. Triste, Eros levantou-se e partiu, deixando a mulher. Psiquê ainda correu atrás do marido, mas ouviu-lhe a voz, ao longe, a dizer-lhe:

“O Amor não vive sem confiança.”


     Eros recolheu-se no castelo de Afrodite, para que ela lhe curasse a ferida feita nas costas. Ao saber da verdade, do amor do filho pela mortal, a deusa sentiu-se traída, jurando que Psiquê jamais viria o filho outra vez.
Abandonada por Eros, Psiquê percorreu todos os oráculos da Grécia, a procura do paradeiro do amado. Mas todos os deuses, temendo à fúria de Afrodite, nada revelaram à bela princesa. Por fim, Psiquê decidiu buscar a ajuda da própria Afrodite. Foi recebida com escárnio pela deusa do amor. Para dar notícias do filho, Afrodite impôs à triste mulher, várias tarefas impossíveis de serem cumpridas. A primeira foi a de que, até o fim do dia, Psiquê trouxesse um grande número de grãos de todas as sementes do mundo. A infeliz mulher saiu desesperada em busca dos grãos. Ao ver quão impossível era a tarefa para uma mortal, os deuses do Olimpo ficaram comovidos. Apolo ordenou às formigas que juntassem os grãos em volta da princesa. Assim, após a fadiga da tarefa, Psiquê cumpriu o que lhe ordenara a deusa da beleza.
     Afrodite ficou furiosa, pois tinha certeza que Psiquê fora ajudada. Como punição, fez com que ela, a partir daquele dia, passasse a dormir no chão frio, sem qualquer proteção, e como alimento, teria apenas a côdea de um pão duro e velho, para que assim, definhasse e perdesse a beleza. Psiquê submeteu-se sem pestanejar, a mais esta prova.




     Quando voltou ao mundo dos vivos, Psiquê sentiu-se esgotada. Olhou-se em uma fonte. Estava fraca, envelhecida, perdera a beleza. Pensou que Eros jamais voltaria a olhar para ela vendo-a daquele jeito. Atormentada por esta idéia, Psiquê decidiu não cumprir aquela tarefa imposta por Afrodite. Abriu a caixa que trazia um pouco da beleza de Perséfone, para que pudesse recuperar um pouco da sua, pensando assim, evitar que Eros a abandonasse quando a visse outra vez. Ao abrir a caixa, uma grande maldição pousou sobre a infeliz princesa, que foi acometida de um sono profundo, caindo adormecida sobre as flores do bosque.
     Recuperado da ferida, Eros fugiu à vigilância de Afrodite, decidido a procurar pelo amor perdido. O deus encontrou Psiquê adormecida no bosque, ao lado de uma fonte. Aproximou-se dela, aprisionando o sono da morte que a envolvia, dentro da caixa de Perséfone. Depois tocou a amada com uma das suas flechas de ouro, fazendo com que despertasse. Ao ver novamente o rosto do amado, Psiquê sorriu-lhe emocionada, atirando-se nos seus braços. Ao saber de todos os sacrifícios que ela fizera pelo seu amor, Eros decidiu desposá-la para sempre.




     Pediu a Zeus que tornasse a mulher imortal. O senhor do Olimpo atendeu ao pedido do deus, dando ele mesmo a ambrosia da imortalidade para que a bela jovem bebesse. Quando Afrodite quis impedir a união do filho, já era tarde. Psiquê tornara-se imortal, e já nada se poderia fazer contra ela. O Amor cobiçara a mortalidade da Alma, apaixonando-se por ela, fazendo-a imortal. Amor e Alma estavam unidos para sempre, imortais que eram, só um poderia fazer o outro feliz e completo. Da união dos dois nasceu a Volúpia.

     “O Amor não vive sem confiança.”

Disse Eros para Psique. A mitologia nos prova também a realidade e a essência da resistência de um amor.

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